Tem um bom tempo que não choro; não é que não me permita chorar, é que não tenho vontade mesmo. Mas tinha decidido escrever esse texto há umas duas semanas, quando li, na aula de Formação do Leitor, o texto “Menino a bico de pena”, da Clarice Lispector. O texto é sobre a ascensão do sujeito, ou seja, como nós nos tornamos nós, como temos o clique e descobrimos: “Eu sou eu”. O conto é sobre um bebê que está descobrindo o mundo, e sobre como ele percebe todas aquelas novidades. E um momento fantástico é quando ele chora. Transcrevo abaixo o trecho em que ele acorda completamente aterrorizado pro não ter a mãe por perto:
“A água secou na boca. A mosca bate no vidro. O sono do menino é raiado de claridade e calor, o sono vibra no ar. Até que, em pesadelo súbito, uma das palavras que ele aprendeu lhe ocorre: ele estremece violentamente, abre os olhos. E para o seu terror vê apenas isto: o vazio quente e claro do ar, sem mãe. O que ele pensa estoura em choro pela casa toda. Enquanto chora, vai se reconhecendo, transformando-se naquele que a mãe reconhecera. Quase desfalece em soluços, com urgência ele tem que se transformar numa coisa que pode ser vista e ouvida senão ele ficará só, tem que se transformar em compreensível senão ninguém o compreenderá, senão ninguém irá para o seu silêncio, ninguém o conhece se ele não disser e contar, farei tudo o que for necessário para que eu seja dos outros e os outros sejam meus, pularei por cima da minha felicidade real que só me traria abandono e serei popular, faço a barganha de ser amado, é inteiramente mágico chorar para ter em troca: mãe.”
Quero me prender à última frase. “É inteiramente mágico chorar para ter em troca: mãe.” O bebê chora porque ele não tem linguagem – gente, linguagem é diferente de comunicação, tá? – e sua única forma de comunicação é o choro. Ele chora e consegue o que quer. Se não consegue, vai continuar chorando até que lhe atendam. E vocês já pararam pra analisar que muitas vezes agimos exatamente do mesmo jeito (as mulheres, provavelmente, mais que os homens)? A gente não consegue o que quer e chora não para desabafar, mas para ver se alguém se sensibiliza e nós dá o que queremos. Tanto é que dificilmente choramos para nós mesmos.
O choro é algo meio desesperador para quem tá do lado de quem está derramando as lágrimas. A gente só quer que a pessoa pare de chorar!! Algum personagem de “Alice através do espelho” diz para a menina: “Considere a menina grande que você é. Considere a longa distância que percorreu hoje. Considere que horas são. Considere qualquer coisa, mas, por favor, não chore!”. Quando alguém perto de você começa a chorar, você simplesmente começa a fala um monte de coisas (às vezes até falsas) para que a pessoa simplesmente se sinta melhor e pare de chorar. O choro alheio é irritante, agonizante e vergonhoso. Sinto vergonha alheia quando vejo alguém chorando copiosamente – e ODEIO sentir vergonha alheia... O curioso é que não tenho vergonha de chorar copiosamente se estiver ao lado dos meus amigos. Mas eles devem odiar me ver chorando. É horrível aquela sensação de incapacidade, de ver a pessoa chorando e você saber que, qualquer coisa que você falar, vai ser tão sem sentido pra ela quanto “Considere que horas são, mas não chore”.
Eu só queria deixar mesmo essa reflexão: será que somos apenas bebês grandes nesse aspecto e, quando estamos aterrorizados, choramos para ter algo em troca?
Sweety, não acho que choramos sempre pra conseguir algo em troca, se não não choraríamos muitas vezes "escondidos", no fim do dia, longe de todo mundo, quando não tem ninguém em casa e com a cara no travesseiro.
ResponderExcluirMuitas vezes, por sabemos que ninguém pode nos consolar, ficamos desolados e as lágrimas rolam naturalmente. Então o choro é o próprio consolo.
E é realmente terrível ver alguém chorando, porque não tem nada que você possa fazer pra parar aquele choro. Pode falar qualquer coisa, fazer qualquer palhaçada, no máximo vc arranca um risinho entre lágrimas, mas não vai fazer aquilo parar imediatamente.
vc também sente vontade de chorar quando vê alguém chorando?! Eu sou péssima pra ajudar "chorões" porque acabo não aguentando e mesmo sem saber o motivo daquela pessoa, choro também, ou pelo menos os olhos enchem d'água...
Eu não lembro de onde vi/ouvi isso, mas algo me diz que foi algum professor que leu algo que fala +/- que nos nossos momentos mais desesperadores, recorremos aquilo mais instintivo, aquele ato mais primitivo do ser humano, o primeiro ato de nossa existência: o choro. E isso parece aliviar aquele sofrimento por um tempo.
Não lembra de algo assim?! Eu acho que deve ter sido até a Janice que leu em sala... mas sei lá, pode ter sido outro professor, ou eu posso ter lido em algum lugar e vc nem nunca ouviu falar disso. rs
Enfim, chega. Tenho que dormir...
Xx
Você sabe que eu tenho um problema SÉRIO de memória, então não lembro... e geralmente eu não sinto vontade de chorar quando vejo outra pessoa chorar, só sinto vergonha alheia mesmo... rsrsrsrs
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