quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Tentativa de uma crônica / O ladrão da felicidade

Isso é uma tentativa de crônica, não aconteceu de verdade não, tá? Enfim. Essa é a primeira vez que escrevo com o meu pseudônimo Clarice Medeiros. Aos contrário da Baby Blue e da Ferds Moranguinho, esse aqui não é um heterônimo porque não tem personalidade própria. Os meus textos "normais" serão assinados como Juliana Lopes. Os felizes, pela Ferds. Os tristes e depressivos, pela BB. Os ficcionais, pela Clarice.


    Recapitulando os acontecimentos, ela sabia que não devia ter desobedecido à sua intuição. Ela deveria ter ficado na faculdade. Ela não precisava de um porta-copos. Mas ela queria, e muito. Foi então ao shopping.
    Lá chegando, passou em frente a uma lanchonete e e ficou com um desejo insuportável de comer um sorvete de casquinha. Antes, porém, foi comprar seu tão sonhado, esperado e necessitado porta-copos. Depois de cerca de cinco minutos olhando diversos modelos, e depois de se martirizar por não ter dinheiro o suficiente para comprar porta-copos da Audrey Hepburn, do BettleJuice, do Jack Skellington, da Alice de Tim Burton, da Amélie Poulin, do Chaplin e do Hitchcock, ela saiu da lojinha perto do cinema com apenas UM porta-copos (que tinha a imagem da capa do DVD de "Pequena Miss Sunshine").
    Ela já estava atrasada para a aula. Precisava correr. Mas também precisava comer. Não, não precisava de verdade, mas ela queria, de um querer tão fero que é quase impossível distinguir esse querer de uma necessidade "real". E, parando para analisar, o que é realmente uma necessidade hoje em dia?
    Mesmo atrasada, comprou a casquinha. Começou a andar em direção à saída do shopping a passos largos, saboreando ao máximo possível o chocolate gelado desfazendo-se em sua boca. Seus dentes doíam, mas ela não ligava. Tinha um sorvete chegando ao seu estômago e um porta-copos da "Pequena Miss Sunshine" na sua bolsa. Nada poderia acabar com sua inabalável felicidade momentânea.
    Passou pela porta automática e chegou ao mormaço sufocante da primavera carioca. Depois de alguns passos, percebera, pelo canto dos olhos, que um homem a encarava. Pela sua expressão, o homem estava tão desejoso de comer aquela casquinha quanto ela. A menina começou a ficar preocupada; andou o mais rápido que suas finas canelas aguentaram. No entanto, foi em vão.
    O homem abordou-a, segurando-a pelos ombros. Não parecia que tinha armas, mas ela teve medo mesmo assim. Ela não tinha forças para lutar com ele. Já previa em sua mente toda a cena que se passaria a seguir, via sua felicidade indo embora em mãos, boca e estômago alheios.
    O homem disse, asperamente:
- Passa!
    Ela fingiu que não sabia do que estava falando. Passou-lhe a carteira.
- Você sabe que não é isso que eu quero, p****!
- Ai, desculpa! - Tremendo e segurando a casquinha com uma extrema dificuldade, a menina tentou ludibriar o ladrão mais uma vez. Puxou o anel de prata do dedo e já ia entregar para o homem, quando este começou a falar, num tom ainda mais rude:
- Cê tá de sacanagem com a minha cara? - Ele ia tirar algo do bolso traseiro de sua bermuda surrada, mas, antes que pudesse ver o que era, a menina entregou-lhe sua felicidade e, com lágrimas nos olhos, saiu correndo. Enquanto fugia do homem que roubara sua casquinha (porque ele ainda podia roubar seu porta-copos!), pensou: o que será pior? Entregar a felicidade para preservar a vida ou entregar a vida numa tentativa de preservação da felicidade?

Clarice Medeiros

3 comentários:

  1. Que ótima crônica! Seu blog tá ficando cada vez mais diversificada. Uma "Juliana Fernando Pessoa"! Obrigada pelas suas visitas. Ah, é um prazer ler seu blog! Parabéns pelos talentos :) Fico super feliz que você tenha identificado as minhas personagens com as suas haha E sabe, eu adoro personagens hipocondríacos! Tenha um ótimo quase final de semana e boa sorte nos estudos.
    Um beijo,
    narradorapersonagem.blogspot.com

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  2. Eu sei que a parte do ladrão de casquinhas é mentira, mas a compra da casquinha foi real? *intrigada*
    E adorei o texto *.*

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  3. OOWN, obrigada pelos elogios, autora!! De coração!!

    Siim, a compra da casquinha foi real rsrsrsrs

    Beijos e bom final de semana pra vcs!

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