Quando entro, quase não consigo
cumprimentar os presentes. Geralmente, estou mais preocupada em jogar minha
mochila em qualquer lugar e encontrar um pequeno espaço para ficar pela próxima
hora. Só depois disso que olho ao redor para ver quem se encontra. Hoje, Marcinha, Lana, a gorda da enfermagem e um moreno que já vi por aqui antes;
conduzindo tudo, Tim. É claro que tem muito mais gente, mas esses são os rostos
conhecidos.
Não sei o nome verdadeiro do Tim.
Ele ganhou o apelido por se parecer – mas só de longe – com o Tim Maia. Como o
ser humano sempre se atrai pelo horrendo de uma forma quase mística e
hipnótica, não conseguia tirar os olhos do seu rosto bexiguento. Parecia que
tinha sido deformado por um enxame de abelhas. Seus olhos quase somem por trás
das sobrancelhas, inchadas como todo o resto. Sua boca até seria um ponto de
normalidade naquela catástrofe, se não fosse sombreada por um bigode que não
diz a que veio.
Apesar da cara assustadora, Tim
parece ser bom. Meio sacana, mas bom. É justamente o que Paulinha está dizendo
quando tiro, por alguns segundos, os fones de ouvido. Marcinha por sua vez, é
bem mais atraente que Tim, apesar de não ser propriamente bonita. Deve ter uns
40 anos. Morena clara, cabelos pretos encharcados de creme para pentear, sempre
tilintando as numerosas bijuterias descombinando entre si. Tinha o olhar da
Brigitte Bardot, mas não sabia disso. Provavelmente, só eu sabia. As outras
pessoas dali não pareciam o tipo de gente que sabia quem tinha sido a musa
francesa.
Quanto aos outros, Lana tinha um
formato roliço e cara de safada. Ia sempre de bermuda, para mostrar a tatuagem
mal feita na panturrilha. A gorda da enfermagem me lembra aquela personagem de
Clarice que mata a amiga com um garfo – a gordura sendo mais marcante que o
nome em si, já que não lembrava como nenhuma das duas se chamava. O moreno era
novo ali, e não tinha nada de especial, além de se parecer com aquele
rapper/ator, o LL Cool J.
Tem gente faltando aqui, mas nunca
dá pra encontrar todo mundo junto. Andreia, quarenta e poucos anos, jeans e blusa
decotada de helanca, cabelos arruivados, longos e cacheados, piercing no dente
(sim! No dente!), uma verruga no meio do nariz. Vascaína. Da Baiana não sei dizer muita coisa. Tem ainda uma velhinha
com cara de tartaruga. Ouvi “Ai se eu te pego” pela primeira vez da boca do
Branco, um rapaz novo de olhos claros e orelhas de duende. Mirela sumiu. Acho
que dava em cima do João, e, depois que o marido descobriu e bateu nela, nunca
mais a vi.
O lanche geralmente ficava por conta
da Edna, de voz estridentemente insuportável, mãe do pequeno desvairado Kevin. Hoje, apesar de Edna não ter vindo, tem lanchinho do mesmo jeito: pão
de queijo, coca cola e um sanduíche de maionese, acho que foi Lana quem trouxe.
Lembro que fiquei meio assustada na primeira vez que vi todo mundo comendo
naquele lugar lotado, às 7 da manhã. Mais assustada ainda quando Edna, sem
querer, meteu bolo de fubá no meu cabelo e, logo em seguida, foi servir um café
extremamente quente para alguém que estava atrás de mim. Agora, depois de
inúmeros lanches coletivos e até mini festas de aniversário, já tinha me
acostumado.
Tentava ouvir as conversas, mesmo
com os fones de ouvido. Nunca era nada profundo. Geralmente, alguma coisa sobre
as obras que estavam sendo feitas, sobre a novela, algum bordão da “Zorra
Total” soltado aqui e ali. Zoações internas também eram frequentes. Desde que
todos falassem o tempo todo, valia qualquer coisa, qualquer assunto. Raramente eu
falava alguma coisa, só sorria às vezes. Ou, se falava, raramente era com Tim, João, Fernando, Alípio e todos os outros que comandavam o lugar. Ao contrário
dos meus colegas de viagem, tentava respeitar minimamente a pequena placa
localizada acima de Tim e falava ao motorista somente o indispensável.